O livro de José Saramago, na esteira tão portuguesa dos intelectuais que naquele país conheceram e combateram o poder material e moral da Igreja Católica, como Guerra Junqueiro e o seu A Velhice do Padre Eterno, consiste em uma bem humorada crítica a um Senhor que por suposto fundamenta o poder da Igreja de Roma. Um dos seus pontos principais é a visão do Velho Senhor como alguém que se sente isolado dos homens, e através da paternidade de Jesus e dos seus sofrimentos, busca recuperá-los para o seu convívio, não através de uma vida mais feliz na terra, ao contrário, mas da esperança em uma felicidade eterna no céu. Esse Deus lança mão dos mártires, das Cruzadas, da Inquisição para construir através da Igreja a sua desejada companhia dos homens. Jesus aparece no livro como alguém que tenta se opor aos planos de Deus, mas fracassa porque o próprio Deus age nele, como taumaturgo e como alguém que ensina e pratica o amor. Saramago resgata o homem Jesus, mas não o Cristo e o seu Pai. A mim parece um pouco ociosa essa reiteração de ateísmo e humanismo do autor, tão própria dos meus tempos de graduação e da nossa herança socialista. Todavia gostaria de levantar apenas dois pontos sobreo livro: 1) Se Deus é Pai de Jesus Cristo, e ambos partilham uma natureza comum, ele esteve pregado na cruz com seu filho e sofreu seus padecimentos. O nosso Deus é um Deus capaz de sofrer; 2) Não há como lutar contra a fé de uma pessoa e de um povo. A própria fé é secreta e misteriosa, nasce nos poros da nossa infância e formação, e mesmo que nos tornemos socialistas, como vem ao caso, essa fé estará presente. Podem-se debater os conteúdos da fé, mas ela em última instância é irredutível e não se deixa perder. Há inúmeras narrativas que recontam a vida de Jesus, como as de Kazantazkis, Anthony Burgess e mesmo Norman Mailer. Acho que nos pontos que toquei aqui elas podem ser consideradas mais interessantes que a de Saramago.
Igor Zanoni
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ResponderExcluir...portanto, apesar de tudo, sendo assim, nunca saberemos quem é ou foi Jesus, esse ilustre desconhecido, além de suas interpretações póstumas...""
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