terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

Sermão da flor


tome esta flor como exemplo
vê-la não é contar suas pétalas
nem medi-la com uma régua
seu perfume não deve ser comparado
a outros perfumes de outras flores
observar esta flor não exige
que se pense sobre ela
que a cantemos com metáforas
um biólogo pode compreender esta flor
na vasta sucessão dos seres
a nós basta vê-la em silêncio
no silêncio se percebe toda a flor
por isto há tanto tempo o Senhor Buda
diante da multidão ergueu em silêncio
uma flor como esta
e assim expôs tudo o que existe
no coração dos Budas Abençoados
e embora ignoremos
também no nosso coração


                                                             Igor Zanoni

domingo, 26 de fevereiro de 2017

Quando o medo bate


pela distraída janela do ônibus
salta súbito o medonho medo
como descer andar pelo centro
caminhar até o trampo?
veja o ilustre passageiro sentado ao seu lado
como também treme
talvez todo o centro esteja amedrontado
ora! em uníssono
abrir a bolsa e pegar a pílula sublingual
logo relaxa volta-se ao estado de pré medo
quem sabe melhor abdicar
da obrigação de andar pelo centro como se deve
de estar no trampo com a velha cara à mostra
quem sabe melhor um uníssono de medo
tomando a cidade
quem sabe o primeiro passo
para a evanescente liberdade
bora todo mundo tremendo junto
que festa revolucionária!


                                                                                      
                                                  ( para todos os que lutam contra a síndrome do pânico)


                                                                         Igor Zanoni

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

Natureza morta



não há nada como a coloração palha dourada
de uma cebola opulenta
sua forma ogival como a de uma igreja ortodoxa
a casca ressecada que se desfolha na mão
o gosto adocicado misturado ao almoço
é justo derramar lágrimas ao se partir uma cebola
 toda ela pede essa exuberância nossa
completando o seu próprio ser excessivo e lascivo


                                                                       Igor Zanoni

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

Tragédia banal



mesmo quem compõe versos
que fazem os anjos sonhar
um dia há de morrer
há de em breve passar
quem canta de modo a fazer
 o demônio de seus pecados
se arrepender
logo há de morrer
há de um dia passar
o mestre ilustre um dia
há de contar moedas para o médico
e transtornar a família
com sua tragédia
também ela banal
apenas os anjos e o demônio
vivem para sempre suas vidas
enquanto houver seres humanos
para consolar e para tentar
em suas breves vidas
cheias de poético viço
ou melódica melancolia


                                                                 Igor Zanoni

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

Casamento


mesmo hoje em dia os homens se perdem
com as mulheres
quando um deles encontra uma mulher interessante
logo já não sabe o que dizer
e a conversa míngua
então ele a pede em casamento



                                                   Igor Zanoni