Lembro com nitidez dessa moça
Que nunca mais vi e não sei onde anda
Nós almoçamos com colegas no Viva a Vida
E ela apanhou de sobremesa
Um mamão papaia com suas sementinhas
Eu não sabia que se podia comer
As tais sementinhas
Nem que gosto elas tinham
Achei estranho e que talvez
Nascesse em sua barriga um mamoeiro
Essa é a única lembrança minha
De minha amiga que não se perdeu todavia
Nos escaninhos da memória
Igor Zanoni
Sem perceber você escorrega
No sono
É o cansaço desses dias cruéis
Vencendo a irritação
Logo você acordará
Pensando se algo mudou
No país
Mas vai sim demorar muito
Qualquer mudança
Muitas pessoas se tornaram outras
O ódio em seu coração
Venceu a decência
A compostura
Então é preciso esperar
E ao mesmo tempo se defender
Deixando o coração inquieto
Fazer breves fugas
Para o relaxamento e o sono
Igor Zanoni
Quando o Senhor Buda
Nas suas palestras-Darma
Falou aos seus atentos bikkhus
Sobre o apego a raiva e a ignorância
Pôde ser ouvido porque encontrou
Pessoas perceptivas dispostas a ouvi-lo
Não pessoas de espírito indiferente
Que nada queriam saber
Esse era o tempo e o lugar
Em que vivia o Venerável
Tão diferentes dos nossos
Igor Zanoni
Eu também peço por aqueles
Que não conheço
Que nunca vi
E vivem espalhados ao meu redor
Eles também criam
O clima o ambiente as opiniões
Dentro dos quais eu vivo
Ignoro seus rostos
Mas eles decidem eleições
Dizem as coisas que ouço por aí
Dão audiência aos programas de tv
Diante dos quais eu passo
Esta é a grande multidão
Da qual me protejo
Com a qual eu lido
Com o máximo cuidado
Igor Zanoni
