sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Intolerância

Intolerância

Os brasileiros são intolerantes. Não falo do dia do orgulho hetero ou da marcha contra a maconha, isso também, mas de pequenas intolerâncias diárias. Dei ao meu filho uma bela jaqueta imitando a dos pilotos de fórmula 1 mas foi proibido de usar na escola, porque era muito colorida e fora dos padrões escuros, verde, azul, preto, que os brasileiros em geral usam. Se você quiser ser notado, faça um penteado um pouco diferente, como o Neymar. Logo todos vão copiar se você for bom como ele. Até ele mudar o cabelo. Mas logo vai ser chamado de Neymáscara ou coisas assim. Veja as famílias. A tensão nas casas é dura de matar, a maledicência clara ou velada rola. As famílias são cheias de políticas mesquinhas, parece o Congresso. Se você colocar um cabelo charmosinho e usar uma roupa mais estilosa todos chamarão você de gay, a menos que você não seja já um emo. Quando no estádio seu time vai mal, a solução é chamar os bons adversários de macacos, como há pouco fez a torcida do santos, meu time aliás, no jogo contra o Flamengo. A grande política segue o caminho. A bela e realista política externa do Lula foi agora tachada de esquerdista e radical na nomeação de Celso Amorim para o Ministério da Defesa. Há sempre os saudosos da ditadura, do poder militar. Tudo bem, o país é mesmo de bang-bang, todos sabem. Onde se matam pessoas por parecerem ou serem gays ou pobres ou negros ou moradores de rua ou por beberem ou fumarem ou serem desempregados ou por algum motivo parecerem uma estranha ameaça aos seus neurônios e logo uma ameaça ao seu bem-estar e felicidade.

                                           Igor Zanoni

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Elixir

Elixir

há pessoas que curtem
caixinhas de remédios fake
como as pílulas de vida do doutor Ross
pois eu sou do tempo de remédios extintos
como o Pyramidon antifebril potente
que me ajudou a passar crises de amidalites
e o Elixir paregórico cujo vidrinho
ficava em casa ao lado do filtro
eu mesmo me servia doses generosas
mentoladas e digestivas
era feito á base de ópio mas o que tem?
garanto que fazia menos mal
que o diclofenato sódico

                                                             Igor Zanoni

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Agosto

Agosto

dias gelados de Curitiba
onde as casas não tem lareiras
e o vento sopra sob as portas
nos últimos dias a chuvinha
espantou o frio
um pouco não muito
mas hoje quando cessou
estávamos em pleno rigor
de suas mãos assépticas e mortais
entretanto era agosto
despertando a espera da primavera
minha amiga Marilice
que é de Bagé
disse sabiamente:
é preciso esperar agosto
espere passar agosto!

                                                 Igor Zanoni

Pessoas exemplares

Pessoas exemplares


há pessoas exemplares
homens instruídos que todos os dias
lêem os jornais
sabem do cor os presidentes do Brasil
em sequencia cronológica
e tem opiniões bem fundadas
guardam grande independência pessoal
e estudam a alta teoria
quando as vejo sinto vergonha
de ter tão pouca solidez
de ler os jornais uma vez por semana
e enjoar-me se leio mais vezes
de ter da história uma visão
menos cheia de informações
e mais desiludida
de lutar a cada dia por meu naco
de independência
e trocar qualquer teoria
pela percepção impressionista
dessas pessoa que passam na rua
de ser tão rude e ao mesmo tempo
tão sensibilizado
pelas dores alheias antes que pela minha
de imaginar utopias caminhos do meio
cheio desse voluntarismo que cai tão mal
nos sábios e nos prudentes

                                                                                                                                                                                                       
                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                      
                                                                                                                           Igor Zanoni

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Ter e ser


Ter e ser


Há pelo menos duas décadas, um importante elemento do dinamismo econômico do Ocidente , incluindo o Brasil, tem sido os gastos com bens de consumo, alavancado pelo crédito farto atingindo faixas da população antes com pouco acesso a ele. No País, temos visto o crédito consignado atingir funcionários públicos com estabilidade no emprego e aposentados e pensionistas do INSS. O crédito é concedido em prazos longos, que diluem os altos juros cobrados. Como os salários e o emprego não crescem na mesma proporção, cria-se uma bolha especulativa, como as que vêm varrendo a economia americana e a europeia. O Brasil tem se saído melhor graças ao dinamismo do próprio crédito e às vultosas exportações de commodities. Mas os salários tem se mantido baixos, e o emprego cresce menos com a elevação dos juros e o corte dos gastos públicos pelo temor a uma aceleração da inflação. Nos últimos meses o governo anunciou um monitoramento maior dos créditos, supostamente para evitar erosão dos orçamentos das classes médias baixas já muito endividadas. Mas o disciplinamento das  novas dívidas não se deu. Os brasileiros continuam se endividando, mas agora a juros maiores. A emenda foi pior que o soneto, como dizia meu avô. Numa sociedade heterogênea onde o grosso da população tem enorme consumo reprimido pelos bens que o mercado valoriza e apontam como emblemas de prestígio, automóveis, motocicletas e outros bens, o resultado não poderia ser diferente. Como disse Marx, no capitalismo as relações entre as pessoas tomam a aparência de relações entre coisas. Ter e ser se confundem. A professora Anna Luísa Carvalho aponta que supostamente as coisas estão aí para todos, e que possuir ou aparentar ter menos é se tornar mesmo mais desvalorizado e menor. A melhor saída, na sociedade sem muita ideologia que temos hoje é baixar os juros, elevar os salários, estimular os investimentos e o emprego e sair do temor da crise com uma agenda positiva.  

                                                           Igor Zanoni

domingo, 31 de julho de 2011

Falando de nós

Falando de nós

as pessoas sempre nos veem
nem tudo ou cem por cento bem
mas não dá para esconder o que somos
mesmo as nuvens tão altas no céu
são visíveis e sabemos se prometem chuva
até as aves que são ciosas dos seus ninhos
e de sua vida social
não podem se esconder de nossos olhos
porque as pessoas são sempre leitoras
das situações das personagens
gostam desgostam começam a armar ciladas
ou se prometem amor eterno
prometer não custa muito
sempre nos surpreendemos
com a sua clarividência
mas sossegue elas compreendem
a partir de sua própria vida e de sua alma
mas não há nada mais diferente entre si
do que duas vidas e duas almas
por via das dúvidas leve em conta o que ouve
examine com a possível imparcialidade
depois paciência ninguém pode ser o que não é
a paciência não é prática
mas é como aqueles remédios antigos
caldo de galinha uma boa noite de sono
tirar umas férias
sempre ajuda e não provoca danos colaterais
é claro que te chamarão de viajante
como ele viaja! ouvi de mim muitas vezes
 mas é melhor que ser interesseiro e materialista
pelo menos disso não me acusaram

                                              Igor Zanoni


                                                       

sábado, 30 de julho de 2011

Fixidez


Fixidez

do seu modo ela ri
mesmo quando há minha tristeza
seu corpo exato ainda
lembra a primeira mocidade
seus gestos suas mãos ou cabelos
dirigem-se a mim
com um conhecimento de perito
e faz o que fazia
quando minha vida a chama
parece que ela é minha
mas eu é que sou seu
repetido nos desenhos da vida
em minha alma há uma fixidez
das borboletas amarelas
que se repetem a cada primavera
de meu tempo interior

                                                       Igor Zanoni