sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Não ser magro


Não ser magro

Logo que começaram no Brasil as operações de redução de estômago, para minha surpresa me vi envolvido com as conseqüências de uma delas. Uma jovem professora que havia feito sua dissertação de mestrado comigo sobre o pensamento social de Marx, cujo sobrepeso se diluía em sua altura e em seu vigor, decidiu que a operação seria a forma de adquirir a beleza que segundo julgava a tornava pouco querida e fora dos padrões atuais de beleza. Achei a princípio uma decisão arriscada, pois a operação apenas começava a ser feita em Curitiba, e que, mesmo se perdesse seu sobrepeso, minha amiga jamais poderia ser uma pessoa convencional com sua inteligência e ironia aliadas a uma esgotante melancolia. Pensei que uma psicoterapia e uma reeducação alimentar deviam ser consideradas como primeira escolha. Depois da operação houve várias conseqüências clínicas, era inevitável, mesmo com ela, uma reeducação alimentar e uma alteração no modo de ver a vida. Tudo isso resultou em uma aposentadoria precoce que a jogou nos braços de psiquiatras com receitas mágicas e caríssimas de felicidade. Recomeçar a vida foi complicado e anos depois estava concluindo duas outras faculdades com brilho, ajudado um companheiro a mudar totalmente seu modo perigoso de viver e continuando uma pessoa um pouco além do peso, talentosa e melancólica. Decidiu deixar os medicamentos por economia, não sentiu diferença, e parecia mais dona de si mesma, sem certeza, porém, de que poderia um dia voltar a trabalhar.
Depois do ocorrido com minha amiga, vi outras pessoas sofrendo operações semelhantes, um deles um médico a quem eu fazia visitas de rotinas, com bastante sobrepeso e que entre uma visita eoutra tornou-se uma pessoa mais magra e saudável, porém quase o mesmo médico que eu já conhecia sob outros aspectos. Vi também casos de pessoas que emagreceram, mas tornaram-se flácidas e de aspecto estranho, outras em que a cirurgia só repôs os mesmos problemas de compulsão a comer doces e dificuldades emocionais diversas. Concluo que apesar de seus resultados devem-se a inúmeros fatores além de o paciente se alimentar menos, embora muitas vezes mal e mais vezes.  Na maior parte dos casos que acompanhei, e foram diversos, houve um desequilíbrio de nutrientes essenciais, havia necessidade de uma dieta controlada por um endocrinologista e um nutricionista, em um mundo onde os alimentos estão se deteriorando por agentes químicos, sementes modificadas geneticamente, consumo de carne em grande escala em cadeias agro alimentares nefastas, um mundo onde o feijão brasileiro foi considerado há pouco tempo por um laboratório de análises especializado de má qualidade.
Acho que tudo isso não é desconhecido para quem tem acesso a revistas e livros sobre nutrição ou ao acompanhamento de um endocrinologista. Estar bem cm sua aparência sempre foi um problema para muitos com algum poder aquisitivo e moderada exposição a novelas, cinema ou outras artes em que o corpo e a presença física envolvem o olhar. Como as mulheres são mais vulneráveis à nossa sociedade fascista, lembro de minha jovem mãe, bastante magrela, fazendo absurdos para engordar, mais tarde para emagrecer, até resolver outros problemas que lhe eram mais essenciais.
Neste ano liguei para minha antiga amiga perguntando, depois de ouvir as últimas, o que a levara a tomar a decisão radical da operação, e ela me deu minha mais recente lição sobre nosso cotidiano: Igor, hoje em dia você pode ser jovem ou velho, de qualquer cor ou sexo, mas jamais pode cometer o erro de não ser magro. É pura exclusão e abandono o resultado.

                                                                                              Igor   

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