Nasci em 1952, na zona norte do Rio de Janeiro, em frente ao morro da Mangueira. Tenho a idade e a origem geográfica de Rio 40 Graus, o filme inaugural do Cinema Novo. Inexplicavelmente, só pude assisti-lo neste final de semana. Impressionou-me descobrir a cidade na época em que nasci: o morro ainda sendo ocupado, de precárias habitações, ruas de terra, o mesmo tempo do ócio das crianças e de muitos adultos, ou das mulheres cuidando da família, do dinheiro curto, da preocupação com que as moças se casassem ao invés de cair em outras veredas da vida. O Maracanã que conheci ainda criança vendo jogos do Fluminense ou do Santos, no cimento original, sem as pastilhas azuis com que o vi. E a negritude do Rio, a maioria dos atores negros ou mulatos. Nesta Curitiba com ares de Europa, esquece-se o que é viver em um país predominantemente negro. Mas vi também a bondade e quase ingenuidade com que as pessoas pobres se tratavam, sua urbanidade, mesmo quando davam para ganhar a vida um jeitinho mais que suspeito. Tudo às claras, um país onde havia mais luz que hoje. E o orgulho com que um personagem responde à pergunta sobre se é trabalhador:- De salário mínimo e tudo! Não entendo porque o filme foi proibido pela censura na época. È um elogio ao Brasil, visto retrospectivamente, um Brasil hoje perdido entre o rolo compressor da autoridade de um governo que pouco muda com as eleições desde o final dos anos oitenta, um país menos original, mais estandardizado nas baboseiras do consumo e da moda incessantemente criadas pela mídia e pela própria estrutura industrial e econômica. Viva o Rio e viva seu calor, uma terra sem a brutalidade das drogas, do Bope, da polícia pacificadora, do governador violento. Viva o glorioso ano de 1952 e dos que não o esqueceram! Se o fizeram, revejam Nélson Pereira dos Santos!
Igor Zanoni
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