segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Dados


você têve um dom extraterrestre
para o que tocava
para sua proximidade
e sua defendida intimidade
mas como tantos entre nós
têve também um dom excessivo
para sofrer
nada te aliviava nem mesmo
seu talento e sua visão das coisas
uma noite você tentou
mais do que era prudente
podia ter acontecido
com qualquer um de nós
em parte aconteceu comigo
em tudo decerto estou contigo
algum de nós precisava dizer basta
e os seus dados foram escolhidos

                                        Igor Zanoni

domingo, 30 de dezembro de 2012

Kierkegaad


Para mim, que conheço superficialmente filosofia e estou lendo pela primeira vez Kierkegaard (As Obras do Amor-Considerações Cristãs em Forma de Discursos), arrisco-me a fazer algumas considerações sem pretensões senão a de esclarecer para mim mesmo o texto e convidar a lê-lo quem se interessa pelo cristianismo e deseja fugir da Bíblia como um manual auto explicável. O amor é exaustivamente pensado como uma obrigação divina e uma iluminação interior. Explico. A medida para amar o próximo é amar a si mesmo, ou na medida em que se ama o próximo deve-se amar a si mesmo. Esse mandamento que condensa a mensagem cristã tem assim via dupla, e se abre numa síntese que é o amor a Deus. Por outro lado, se alguém diz que não pode amar “o homem”, mas sim este ou aquele homem, isto deve ser verdadeiro para o amor a todos os homens e, portanto não apenas a indivíduos particulares, mas a um “homem “genérico, síntese de todos os outros dos quais procede e ao qual aqueles remetem. No que se refere ao amor entre um casal, mesmo que nada se modifique exteriormente, e se considere, como diz Paulo, o homem a cabeça do casal, a submissão da mulher ao homem e o dever do homem respeitar sua mulher e não irritá-la, ao mesmo tempo o amor entre ambos, sendo um amor cristão, ilumina a relação e a transforma desde dentro, de modo que já é de outro amor de que se fala . Novamente uma polaridade e uma síntese. Assim procede o autor, num modo de pensar que se inspira na dialética de Hegel e privilegia o viver humano como viver e transformar o mundo, ainda que este aparentemente não se altere. Os exemplos se multiplicam e esclarecem a cada momento o que é afinal o amor, considerado em suas obras. Porque é nestas obras que afinal se dá a conhecer, partindo da vida de cada um e de suas relações, com o próximo, consigo e com Deus. Coloca-se este em último lugar, apenas porque para Kierkegaard não se pode amar o “Invisível” sem amar o que é “visível” e está ao nosso lado. O amor transforma as relações do ser humano com outros desde a forma como compreende e se dispõe a viver o amor, isto é, desde a forma como vê o outro e se dispõe a amá-lo. É uma obrigação que revoluciona o que está aparentemente imutável. Na verdade não se conserva imutável porque para cada um tudo ao redor muda, a partir de sua própria essência cristã, obedecida e conquistada. É um autor que se põe contra o status quo, no qual se entrevê uma linha de pensamento que parte do viver de cada um, de sua existência, que o amor em sua exigência revoluciona.

                                                Igor Zanoni

Romances


há romances bons, verossímeis ou até bem documentados, nos quais os personagens são coerentes, bem construídos. nesses romances há tudo que o público em geral, embora aqueles não se dirijam a este, espera ou sente prazer: diálogos tensos, relacionamentos difíceis, cenas de amor e sexo originais e prazerosas, política de uma época ou ainda atual, e assim por diante. Acho que um bom exemplo são os romances, com trabalhado tecido histórico, do português Miguel Sousa Tavares, Equador ou Rio das Flores. No primeiro, o tema é o final da escravidão na última colônia português a mantê-la, as ilhas de São Tomé e Príncipe, no golfo da Guiné, sob pressão inglesa, no início do século XX e final da monarquia lusitana. Cerca esse tema as desventuras do governador da ilha, recém-designado por Dom Carlos e um dândi liberal que quer abolir a escravidão de fato, embora os plantadores locais queiram mantê-la, e Portugal apenas disfarçá-la . No segundo a estrutura da narrativa é parecida, com o tema do salazarismo e do franquismo eclodindo na península ibérica e seus diferenciados impactos sobre latifundiários, um povo comum cansado da república com suapolítica turbulenta e finanças mal controladas. são livros bons, que recomendo, mas há diferença entre um livro bom e um grande livro, com o pathos de Juan Carlos Oneti, Robert Arlt, Faulkner ou os maravilhos contos de Guimaraes Rosa de Corpo de Baile ou Noites do Sertão, com sua violência latente e suas veladas relações de poder na sociedade agrária mineira.

                                                   Igor Zanoni

sábado, 29 de dezembro de 2012

Sábado


quando os violentos
 se tornarem amorosos
os avarentos
mudarem-se em generosos
quando os mentirosos
disserem com cuidado a verdade
e quem fere
sentindo a dor do ferido
passar a amar
então poderemos
comemorar o sábado
um rabino contou a estória
de que estamos na tarde de sexta feira
e o trabalho de Deus
agora repartido com os homens
está inconcluso
por isso a natureza geme
com as dores de parto
do que mais tarde seremos
quando afinal pudermos
comemorar o fim da criação

                                            Para meu irmão Siddhartha

Igor Zanoni 

Veja e leia


veja, leia, daqui a dois minutos
mudaremos a foto e a manchete
mas a notícia será a mesma
uma morte violenta aconteceu
os ricos escolhem onde morar
em lugares que você pode saber
por alto mas nunca visitar
há mais mulheres famosas nuas
a corrupção é velha como o Brasil
mas aqui apontam-se novos nomes
ainda que das mesmas famílias
o salário mínimo subiu mas bem pouco
o Minha Casa Minha Vida bate recorde
de construções
mesmo que você não queira morar
 em uma delas
a Previdência atinge novo défit
e compromete a meta do superávit fiscal
mas os bancos vão não ficar
sem dinheiro do orçamento
você não é ninguém se não for famoso
o facebook é feito de uma alegria
que não dura
tudo precisa ser rapidamente renovado
mas nunca será para valer

                                                  Igor Zanoni

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Dorflex


ela se foi deixando
suas caixas de comprimidos
pensei em devolvê-los
mas evitei novo contato
além disso pode ter sido
uma aposta inconsciente
de que sem mim eles seriam
dispensáveis
parece que ela começa
com otimismo uma nova vida

                                                         Igor Zanoni

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Sonhos


explicitação mas como problema
 do implícito
que exige outras explicitações
infinitas e infinitesimais
mas às vezes de fácil decifração
como um enigma para crianças
outra vezes truncados
de refinada secura
memórias que se vestem
para um baile de máscara
poucas vezes feliz
tormentos noturnos
coágulos da verdade
que de dia vivemos
mas não vemos com clareza
apologia da nossa vida verdadeira
porque há nos sonhos
esta revelação do agreste?
que rara vezes somos felizes
e os sonhos destroem
nossa ilusória felicidade?

                                             Igor Zanoni

domingo, 23 de dezembro de 2012

Reatar


gostaria de reatar com muitos
antigos amigos e amores
as ilusões da vida
segredos planos desejos
mas isto levaria muito tempo
demandaria uma delicadeza
que eu não sei se tenho
tomaria um tempo enorme
do meu trabalho da minha família
da necessidade de repousar
que aumenta na minha idade
mas não se trata apenas de tempo
ou idade
criamos uma vida
que não podemos viver por inteiro
mas aos fragmentos
como meteoros riscamos o céu
da vida de muitos
mas somos apenas fragmentos
que caem longe de tantas vistas
ou se incendeiam
no ar opaco que para nós todos
é vital

                                                             Igor Zanoni

                        

sábado, 22 de dezembro de 2012

Banalidades


não gosto de banalidades
muito menos de pessoas banais
converso melhor com o jardineiro
que com muitos colegas professores
o sentido da vida não é dado
pela posição que alguém ocupa
e que se esforça por alcançar
não é dado pelo seu lugar
na política e na sociedade
nem pela beleza de sua mulher
o que mais chama a atenção
 em uma mulher
é sobretudo sua inteligência
e seu humor
não convém ser muito gordo
mas jamais farei fila
na hoste dos cultivadores da magreza
como sinal de beleza
e de alguém desejável
não me guio por desejos comprados
meus desejos faço á mão
o amor é um artesanato paciente

                                                                Igor Zanoni

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Sedução


há belezas que paralisam e comovem
olhar fixo de uma serpente atenta
não é necessário que seduzam
invertem os polos da terra
rompem com uma adaga
ligações e compromissos
é impossível defender-se
há muitas coisas das quais
não podemos nos defender
melhor a prudente entrega
feliz como um cabrito solto
pastaria tranquilo
em seu monte de vênus

                                                     Igor Zanoni

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Intimidade


a intimidade se estabelece
sem perguntas
entre a mão e a chave
do homem que sai e entra
em sua casa
rapidinho se faz entre a boca
e as palavras que o homem
maneja para controlar
sua vida
de modo que os atos são
cada vez mais
subliminares e automáticos
e substituem o homem
por uma tosca imagem
que vai e vem
fala e faz isto e aquilo
sem perguntas
sem questões a si e aos outros
tornando-o um hábito desnecessário
e sombrio

                                           Igor Zanoni

                                                     

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Apocalipse


o bom de ser evangélico
é não ver o apocalipse
como caos e destruição
diabos à solta e caldeirões ferventes
à espera dos pecadores
antes se espera o apocalipse
como a vinda próxima de Cristo
entre as nuvens
para que todo olho o possa ver
levando para si seus escolhidos
que são também os que o escolheram
entre trombetas de arcanjos
os mortos ressuscitando dos túmulos
a reunião dos que se tinham separado
quando menino tinha medo de morrer
minha oração noturna pedia sempre
a volta breve de Cristo
para que eu não precisasse morrer

                                                        Igor Zanoni

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Paz


quem semeia a paz
joga sementes de paz
nos jardins vizinhos
quem anda com paz
anda com ela duas vezes
quem pede paz
recebe a paz
como o melhor presente
a paz é silenciosa
quem tem paz
fala baixo e distintamente
não é preciso orar pela paz
ela um dom natural
recebido quando se está
presente e atento
quem recebe paz
ganha na loteria
quem oferece paz
ganha a mega-sena

                                                  Igor Zanoni

domingo, 16 de dezembro de 2012

Fazer


tudo que fazemos é visto
como vitória
casar sair de férias ter um filho
ascender no emprego
além de mil afazeres na vida diária
assim como se vê como desacontecimentos
separar-se perder um filho ou o emprego
infelicidades em um mundo duro
ao qual temos de responder
como um vitorioso
ou uma pessoa atraente
ou o que nunca jamais errou
ora essa é uma visão tola e perversa
o mundo é perverso e tolo
no limite inacabado
damos sempre com a cara na parede
o que fazer se no mundo
há tantas paredes?

                                              Igor Zanoni

Tempos difíceis


dependendo da época do ano
sente-se assim ou assado
o Natal é perigoso
pessoas que nunca se falaram
durante o ano todo
agora querem ficar juntas
o telefone não para
os e-mails e o face ficam atulhados
o Ano Novo é um período mais cínico
quando nos brindam impostos
férias com as rusgas de sempre
tudo pelos olhos da cara
o melhor é que acabe
a melancolia das férias
voltemos ao trabalho
como disse Freud
o trabalho organiza a vida
precisamos trabalhar na encrenca
onde trabalhamos para ter algum arranjo
com a vida?
pior quando há encrencas na família
ou quando não se decide
num caso de saias
os tempos são difíceis
piores quando há muita burrice

                                                                         Igor Zanoni

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Mentira


percebo que minto
não sei em que extensão
a mentira permite uma vida
falseada
talvez a única pssível
muitos buscam o bem por toda a vida
mas o acham apenas aqui e ali
fizemos na nossa aurora
um pacto com o mal
é difícil buscar o que não somos
embora imperativo


                                                               Igor Zanoni

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Descaminhos


você vai por um caminho
que eu não posso encontrar
nem compreender
às vezes marcamos um encontro
mas você onde andará?
combinamos planos
que eu tento cumprir
sempre sozinho
enquanto você faz não sei o quê
parece que ensaiamos
 uma canção dos Beatles
“I say yes, you say no...”
mas como um homem antigo
nunca ofende uma mulher
nunca pergunto
o que você pensa da vida
 o que está fazendo comigo
por que entre tantos caminhos
há tantos descaminhos?

                                       Igor Zanoni

Final de Ano


as mulheres no centro
quase todas gordas
a maior parte pequenas
e já não tão novas
vêm atulhadas de pacotes
devem ter gasto todo o cartão
das Pernambucanas
levam como podem
 suas incômodas crianças
quando a criança tem fome e sede
compram pastel e refrigerante
que vão todas tomando na rua
porque não podem perder o ônibus
o dia passa e há ainda
tanto por fazer
até as jovens grávidas precisam sair
para se sentirem mal no calor
mas estas vêm com seus namorados
e maridos
porque são jovens e talvez levem
 no ventre
um novo menino Jesus

                                                 Igor Zanoni

Música


você já viu clips
cantores no palco
pessoas cantando concentradas
os braços abertos
o rosto mostrando toda a emoção
que estão sentindo
o corpo se movendo
suave ou sôfrego
em uma capela também há músicos
há música em qualquer igreja evangélica
a cada duas quadras uma da outra
a música distende
ajuda a passar a mensagem
a música é ao mesmo tempo
encantamento e fingimento

                                                    Igor Zanoni 

sábado, 8 de dezembro de 2012

Um homem decente


ele esta vestido decentemente
mas não com seu melhor terno
a cabeça presa com um lenço
para o queixo não cair
pranteado pelos próximos
um pouco indiferente
aos amigos da família
que cumpriam uma visita de praxe
afinal noblesse oblige
era tudo mais ou menos esperado
ele tivera tempo de dizer adeus
logo partiria para os montes e vales
do Santa Cândida
já maior que uma pequena cidade
alguns diziam banalizavam
palavras sobre o destino humano
outros se calavam
o que é bem melhor
pois não fora ele desta para a melhor?

                                                         Igor Zanoni

Salto


ele era uma pessoa grande e expansiva
gostava de vodka e de fumar
crítico e genioso tinha poucos
mas grandes enormes amigos
que o amavam
como não gostava de gastar em roupas
comprava ternos de brechós
especializados em heranças
de defuntos canadenses
em suma era uma figura
um dia decidiu largar a vodka e o cigarro
fez um regime rigoroso
apequenou-se
ficou magro e enrugado
envelheceu uns dez anos
como não gastasse de gastar em roupas
elas ficavam sobrando em seu corpo
agora magro
decidiu se aposentar
separou-se da mulher com quem vivia
há trinta anos
 perdeu sua verve
decidiu se aposentar
pois até os amigos ficaram confusos
moral: algumas mudanças são necessárias
mas não se deve esquecer
que a natureza não realiza saltos

                                            Igor Zanoni

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

A Hora Final


quando eu morrer
só espero que não doa
e que não fique muito assustado
ninguém chore muito
morrer é coisa banal
não é o pior que pode acontecer
não penso no céu
acho que cada um faz o que pode
é o meu limite de otimismo
não Jesus não voltará
da mesma forma como não fizemos
a revolução
espero que o mundo se mantenha
que a humanidade tenha algum juízo
quero morrer em paz
não me incomodem muito

                                                     Igor Zanoni

Augusto dos Anjos


1.       Entre os poucos livros de papai havia dois de poesia: a obra de Bilac completa e o ”Eu e outras poesias”, de Augusto dos Anjos. O primeiro se explica: ainda jovem, conheci Bilac como o “Príncipe dos Poetas Brasileiros, que escreveu o famoso:” Ora, direis, ouvir estrelas...”, tão celebrado  e declamado nos antigos recitais pelas antigas estrelas desses doces encontros ( outro poema favorito delas era o “não sei por onde vou..”, de José Régio). Ademais, Bilac é o patrono do Exército brasileiro, e meu pai era militar. O outro livro talvez se explique por sua encantadora rudeza e estranheza, ficou um bom tempo esquecido, depois foi reabilitado por Ferreira Gullar em edição comentada. Papai era do Corpo de Saúde, e devia gostar de poemas tão pouco líricos como “Eu, filho do carbono e do hidrogênio...”(acho que era isso, meus livros estão tão empilhados na sala que não posso conferir). Para mim, esses livros estranhos foram minha introdução à boa poesia. Depois tive minha fase Guilherme de Almeida, um poeta injustamente esquecido, para afinal no colegial conhecer Fernando Pessoa e outros realmente grandes e contemporâneos, menos no tempo que no seu existencialismo e lirismo tão próximo de nossa luzitanidade. Mais tarde ainda, fiz minhas própria seleção, que logicamente incluía Bandeira, Drummond, Cecília Meirelles e outros do grande modernismo, bem como muitos estrangeiros(Camões, Yeats, Keats, John Donne, Cummings...). Mas a origem de tudo foram os livros de poesia de meu estranho pai.  

                                           Igor Zanoni

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Om do universo


1
Eu sempre ouvi um pequeno zumbido, que achava natural. Talvez fosse um som do corpo funcionando, ou o barulho das coisas em volta se movendo. Mas indo ao otorrino esses dias ela constatou uma perda de audição nos sons mais baixos e perguntou se eu não ouvia um leve zumbido. Perguntei a ela se o mundo era silencioso, e ela confirmou. Minha irmã disse que eu pensei estar a ouvir o OM do universo, e riu muito.

2
Na semana passada eu estava no RU com alguns alunos e a conversa girou em torno das eleições do Centro Acadêmico e do DCE. Mas quando eu entrava de volta no prédio onde ia dar aula, um deles ficou sozinho comigo e perguntou se eu acreditava em Deus. Eu respondi que na minha forma pessoal eu acreditava sim. Ele contou que de um tempo para cá Deus falava com ele. Pediu para ele deixar o cigarro em primeiro lugar, depois com frequência o orientava na vida. Ele achava fantástico, nem sabia como explicar, era maravilhoso.

                                                          Igor Zanoni

domingo, 2 de dezembro de 2012

Baixio


os rios são lentos terrosos
acomodam-se nas margens vegetais
acolhem o ser com poços e funduras
inesperadas
silenciam a noite em volta
com o chiar de rãs e rastros de cobras
nessa lentidão descem até o mar
exuberante de sol e de corpos cuidados
enquanto os rios cruzam os continentes
a seu modo primitivo e caboclo
o mar desconhecido cessa sua ira
no baixio das terras

                                                                    Igor Zanoni

Acontecências


afinal todas as grandes acontecências
de minha vida findaram
espero
eu que lidei com elas como pude
como uma pessoa comum
agora meu carma sai pelo mundo
provocando seus efeitos
mas quanto a isso pouco posso fazer
quando minha vida em breve
também findar
que seja discreta e calmamente
aí afinal as últimas acontecências
findarão ou pelo menos
aos poucos todas se desligarão
de meu nome e minha lembrança

                                                             Igor Zanoni