Para mim, que conheço
superficialmente filosofia e estou lendo pela primeira vez Kierkegaard (As Obras
do Amor-Considerações Cristãs em Forma de Discursos), arrisco-me a fazer
algumas considerações sem pretensões senão a de esclarecer para mim mesmo o
texto e convidar a lê-lo quem se interessa pelo cristianismo e deseja fugir da Bíblia
como um manual auto explicável. O amor é exaustivamente pensado como uma
obrigação divina e uma iluminação interior. Explico. A medida para amar o
próximo é amar a si mesmo, ou na medida em que se ama o próximo deve-se amar a
si mesmo. Esse mandamento que condensa a mensagem cristã tem assim via dupla, e
se abre numa síntese que é o amor a Deus. Por outro lado, se alguém diz que não
pode amar “o homem”, mas sim este ou aquele homem, isto deve ser verdadeiro
para o amor a todos os homens e, portanto não apenas a indivíduos particulares,
mas a um “homem “genérico, síntese de todos os outros dos quais procede e ao
qual aqueles remetem. No que se refere ao amor entre um casal, mesmo que nada
se modifique exteriormente, e se considere, como diz Paulo, o homem a cabeça do
casal, a submissão da mulher ao homem e o dever do homem respeitar sua mulher e
não irritá-la, ao mesmo tempo o amor entre ambos, sendo um amor cristão,
ilumina a relação e a transforma desde dentro, de modo que já é de outro amor de
que se fala . Novamente uma polaridade e uma síntese. Assim procede o autor,
num modo de pensar que se inspira na dialética de Hegel e privilegia o viver
humano como viver e transformar o mundo, ainda que este aparentemente não se
altere. Os exemplos se multiplicam e esclarecem a cada momento o que é afinal o
amor, considerado em suas obras. Porque é nestas obras que afinal se dá a
conhecer, partindo da vida de cada um e de suas relações, com o próximo,
consigo e com Deus. Coloca-se este em último lugar, apenas porque para
Kierkegaard não se pode amar o “Invisível” sem amar o que é “visível” e está ao
nosso lado. O amor transforma as relações do ser humano com outros desde a
forma como compreende e se dispõe a viver o amor, isto é, desde a forma como vê
o outro e se dispõe a amá-lo. É uma obrigação que revoluciona o que está
aparentemente imutável. Na verdade não se conserva imutável porque para cada um
tudo ao redor muda, a partir de sua própria essência cristã, obedecida e
conquistada. É um autor que se põe contra o status quo, no qual se entrevê uma
linha de pensamento que parte do viver de cada um, de sua existência, que o
amor em sua exigência revoluciona.
Igor Zanoni
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