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Aos quinze anos ganhei de minha professora na escola sabatina, dona Judith Emma Schuck, um exemplar de “Entre a água e a selva”, de Albert Schweitzer, contando sua experiência como médico no Congo Francês. Muito mais tarde pude indagar o significado desse gesto. Como adventista, Dona Judith dificilmente poderia avaliar a singular e importante teologia que o autor desenvolveu, ou seus escritos sobre a civilização moderna e a ética. Talvez, como alemã, tivesse orgulho daquele que foi um dia considerado “o maior homem do mundo”. Talvez tivesse orgulho semelhante ao que tinha por Bach, cujas árias entoava em cultivado soprano na pequena igreja da rua Joaquim Novaes em Campinas, para pessoas que não podiam agradecer seu dom. Talvez se julgasse uma desbravadora da cultura em nossa latitude, o que não poderia evitar dado o esmerado apreço pela cultura da Europa central. Muito mais tarde, em outro contexto na vida, pude perceber como fui feliz em conhecer dona Judith.
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Dona Anair, como todos nós, pode ser vista sob vários prismas, mas me alegro sobretudo com a resignação, que é um talento estóico e epicurista, como assinala Albert Schweitzer em Cultura e Ética, com que cuidou sempre da casa, do marido, dos filhos e dos netos tendo como apoio algumas qualidades nem sempre fáceis de encontrar, como uma fé cega, um grande interesse pelo que pode lhe cair ás mãos, como um prêmio pela entrega do dízimo na paróquia, e sobretudo seu humor malicioso. Esse humor lhe permitiu dar dois reais ao seu José, pedindo que jogasse nas cobras e lagartos.
Igor Zanoni
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