sexta-feira, 15 de julho de 2011

A Espera

A Espera

imediato ficou claro o inesperado
ela para sempre embora
inútil negociar com a vida
fiz o óbvio insônias médicos
todos os centros espiritualistas
hospitais prolongando a casa
o presente se fechou
em um circuito de dor
irrealidade espanto que consumia
as reservas de espera
fiz me um com essa lida
cuidei do que veio
vigiava a dor a hora dos remédios
e os abraços o carinho
rotina restabelecida como se a nova vida
fosse uma nova vida
essa irrealidade me susteve
até mostrar sua outra face
a da realidade negada
fiquei tão surpreso
leve veio o fim
findar esse sonho
e o luto pôde tomar seu lugar
em uma casa convalescente

                                                     Igor Zanoni

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Retraimento


Retraimento


percepções reconfiguram todo tempo
o meu espaço minha mente
os sons do avião da ambulância
as crianças batendo seus skates no chão
em seus infinitos ollies
a vaga do trânsito e sua inerente tensão
no amarelo o carro atrás já buzina
os fatos inúteis que os locutores na tevê
insistem em dar como divertidos ou informativos
o saldo das relações todo o tempo
subindo e descendo como ações
ou avisos de risco
chantagens ininterruptas que temos de responder
segundo esta ou aquela expectativa
esta ou aquela auto percepção
o telégrafo em uma guerra traduzia
essa informação ansiosa
recolher ir para o abrigo sair imediatamente daqui
mas estas percepções criam um mundo
que querem te acolher e não destruir
apenas seja um elemento na paisagem móvel
nervosa tensionada
o seu salário vai dar até o fim do mês?
você tem de ver isto ou aquilo
comer um pizzaburguer com a cerveja arroto
ouvir como até os pássaros foram chegando
e se aninhando no bairro
mas eu não sou daqui
meu tempo está por um triz
eletrizado na cerca dos quintais que se afastam
morrem na cidade feliz
na qual tudo anda junto em instâncias rítmicas
paramilitares parabólicas
eu não quero estar atento a tudo
por favor não me chamem a atenção
é que eu estou atento a um curso mais lento
onde me vou mais leve
tenho saudade do futuro?
tenho desejos de que?
a minha mente se concentra e relaxa
em um mar de retraimentos


                                                       Igor Zanoni
                                               

Inovações


Inovações

Muitas coisas caem em desuso por razões que tenho preguiça de listar, ligadas á tecnologia, preços e outros fatores econômicos. Por exemplo, as máquinas de costura domésticas. Minha mãe tinha uma Pfaff excelente, onde costurou até vir a calça jeans roupas sob medida e à nossa escolha. Eu ia à Igreja com elas, onde mamãe costurava roupas para doação a pobres. Mamãe tinha várias habilidades em desuso hoje, além do ofício de costurar para os filhos, como cozinhar maravilhosamente e fazer cerveja caseira. Eu sempre fui bem cuidado por ela. Outras coisas são revolucionadas pela indústria cultural, que para mim substituiu os domingos na Praça Carlos Gomes em Campinas ouvindo marchas de John Phillip Souza pela Jovem Guarda, que era muito pior mas me parecia melhor. Era uma novidade e as pessoas são novidadeiras. Mas há coisas que o progresso insensato e descuidado liquida. Nos natais em casa papai fazia em uma grande bacia de cobre uma paeja ricamente adornada, onde escolhíamos os frutos do mar que mais gostávamos. Eu mesmo aprendi a fazer uns pratos com papai como bacalhau ao forno e pratos nordestinos. O bacalhau hoje está com o preço nas nuvens e me esqueci como prepará-lo. Deve ter na internet. A paeja é um prato em vias de extinção como os frutos do mar.Dizem que em meados do século o mar não dará mais peixes. É triste para mim, mas para um evangélico uma boa notícia, pois crêem que quando tudo ficar irremediavelmente pior, Cristo voltará e aí ficará tudo melhor não de novo, mas de outro jeito, não imagino qual. Infelizmente não acredito mais nisso, de modo que deveríamos fotografar as paejas ainda feitas nos Natais e outras datas comemorativas para mostrar aos netos como se comia bem antigamente, mas é provável que eles não trocassem seu sanduíche de isopor por comida de verdade.

                                                             Igor Zanoni

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Futuro

Futuro

como sabemos, o futuro
está na laranja fonte de vitamina c
e antioxidantes
também no fio dental
não das praias mas o antigo
usado após as refeições
segundo a Rider’s Digest
aumenta em 20% a expectativa de vida
como podemos ver
podemos alcançar o futuro
melhores do que imaginamos
mas a que custo!
e para que?

                                  Igor Zanoni            

terça-feira, 12 de julho de 2011

Relações

Relações

eu cultivo minhas relações
telefono visito escrevo
viajo para ver como estão
os irmãos os sobrinhos
procuro fazer da vida
uma experiência lúdica e coletiva
mas ainda assim perco irmãos amigos
namoradas casamentos
com essas rupturas marco meu tempo
isso foi no tempo do meu primeiro casamento
ou isso foi quando papai vivia
marco também meu tempo interno
tantos casamentos tantos funerais
para os outros o mundo também anda
tomam esta ou aquela forma de ver as novidades
ou de se proteger das amarguras
convertem-se ou esquecem o que disseram
as relações são preciosas
feliz quem sabe dar a elas o valor que valem
e perdoar o que não valem

                                                        Igor Zanoni

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Zen!

Zen!

as nuvens são mares
sobre o mar de nossas ilusões
são ilusões também
quase sem consistência
guardam raios ventos fortes
como as nossas ilusões
tão inóspitas
como se colocar ao alcance
da calma
como dançar a vida
em ritmo de um bebop
se todas as decisões são tolas
não há o que decidir
há o que largar
o que largar?
não responder a essa pergunta
diante de um mestre zen

                                                        Igor Zanoni

domingo, 10 de julho de 2011

Neymar e companhia

Neymar e companhia

A torcida não gosta da ideia, mas um jovem talento como Neymar, há cerca de um ano no time principal do Santos e titular da renovada seleção de mano Menezes, deve ir para a Espanha mal completados seus dezenove anos. Ganha quinhentos mil reais de salários fora premiações, publicidade e outras rendas. No Real Madri vai ganhar bem mais. Muitos jovens com menos idade e menor talento saem também, como Lucas Piazón, do São Paulo. A torcida os chama de mercenários mas a indústria do futebol não tem o interesse da torcida. Seu negócio é o negócio, às vezes corrupto e corruptor. Poucos dos jogadores brasileiros têm chances aproximadamente rendosas como Neymar tem e terá, se nada acontecer com ele nesse esporte de alto risco e contato violento. Ele aparece sempre ao lado de seu pai, que o empresaria e compra suas brigas enquanto ele mantém sua cabeça em sua boa performance e em sua boa imagem. Em jogo recente na Escócia, ele foi chamado de “macaco”. Essa é parte da sua vida, herdando o patrimônio genético da maior parte dos brasileiros. Não espera bom tratamento no futebol como em nenhum setor da vida, exceto os que ele puder comprar, talvez. Daí a fome de grana. Dele e dos que vivem de suas jogadas, os empresários entrelaçados na rede do esporte, perdão, negócio. Manter a boa imagem familiar é parte de sua estratégia natural de se sair bem na vida, ainda mais que como bom evangélico, crê nesses valores familiares e os encarna. Vi na televisão esses dias o meia do Botafogo Maicossuel  dizer que chegou aonde está  na vida graças ao pai. Ele mora no clube desde os onze anos. Seu pai o ajudava no final de semana, quando se viam, a catar latinhas e vender para completar os quinze reais que gastava nos outros dias. Ele adora o pai, sua grande referência. Num país sem boa educação, saúde, perspectivas profissionais para quase todos os jovens, principalmente negros e pobres, seu pai fez a única coisa que podia para levar o filho onde hoje está, além de contar com enorme dose de sorte.  Poucos sabem, mas em países ricos jogadores de tênis ou de baseball ganham muito mais que os nossos jovens ídolos. Eles que ganhem o que puderem, é a lógica do mundo.

                              Igor Zanoni