quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Inimigos:uma história de amor



o velho professor do prédio A
não suporta o velho professor do prédio A´
são velhos inimigos políticos
nesta idade venerável tem muita sorte
quem possui um inimigo político
não vale mais que um grande amor?

                                                       Igor Zanoni

terça-feira, 29 de setembro de 2015

Primavera



mal a primavera na esquina
meu mínimo jardim
súbitas pesadas rosas
seios fragrantes
mamões verdes uns sobre os outros
já sugeriam ali doce em calda
rosas mamões me excedem
coroai-me de rosas e mamões breves
e basta


                                           Igor Zanoni

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Dalai Lama



O grande escritor Yasunari Kawabata, com uma obra voltada para o exame e cultivo da tradição cultural japonesa, quer inclui seu trabalho como ficcionista, disse que mesmo que o patrimônio religioso budista possa não ser aceito por muitos, é inegável o grande valor da literatura que originou. O primeiro escritor de prosa no país foi Mestre Dogen, além de grande poeta. No início do século XlX, Mestre Dogen, descontente com a situação do budismo japonês,  percebida no país como um darma que vivia um período de degenerescência, viajou para a China e lá encontrou uma tradição vigorosa no Zen(Chan) chinês, que reformulou na sua volta criando o Zen japonês na sua vertente Soto, hoje dominante. A preeminência da meditação sobre o ensinamento, a prática da atenção plena e a reafirmação do significado permanente do darma elaboradas por Dogen entre outras contribuições ao budismo podem ser encontradas em mestres contemporâneos como o vietnamita Tich Nhat Hahn e outros. As escrituras tradicionais budistas são encontradas em cânones diversos e não se pode ter uma unanimidade sobre grande parte do que o Buda Sakyamuni disse, mas serviram como permanente ponto de partida para retomadas sobre a visão fenomenológica do budismo sobre o sofrimento humano, a ética e a prática da compaixão, a interdependência entre os seres sencientes animados e inanimados, inclusive na construção da nossa visão do que acontece, entre outros de seus aspectos básicos. Graças ao líder espiritual do Tibete, o Dalai Lama, encontramos há algumas décadas no Ocidente não apenas ensinamentos sobre a felicidade e o bem-estar (muito popularizados por psiquiatras ocidentais), mas uma profunda erudição nascida na região desde o século Vl., que pode ser estudada em volumes como Pacificando o Espírito, Como um Relâmpago Rasgando a Noite, Dzogchen, por exemplo. Independente da avaliação que se faça da situação política do Tibete é inegável o valor de sua literatura e de sua cultura tão presentes neste homem pequeno e frágil fisicamente. Ainda que para o Zen japonês esta literatura não tenha o papel que possui para o budismo tibetano, este é sem dúvida um guardião e cultor de uma matriz sem a qual o budismo não pode ser compreendido ou praticado. No Brasil esta literatura tem sido um ponto de partida para diversas formas exitosas e cultivadas de um budismo com características de permanência e recriação, falando-se mesmo de um “budismo brasileiro”, sem esquecer outras formas sob as quais ele é cultivado no País.


Igor Zanoni

domingo, 27 de setembro de 2015

Caracóis dos seus cabelos




os muito sozinhos choram por si mesmos
sem saber por que em tão vasto mundo
são assim tão sozinhos
da janela lateral veem os meninos
andando de skate
e as meninas com seus meninos
e bebês que as avós e as sogras
levam ao postinho para pesar ou tomar vacina
debaixo de sombrinhas
ninguém ganha muito mas todos se divertem
mesmo os muito sozinhos
esperam a hora da missa
para em suas dores juntarem-se à dolorosa Virgem
as mãos ferreamente postas
os olhos acariciando a imagem do Filho
que belos olhos azuis a Senhora tem
e que belo Filho este a Senhora Virgem deu a nós
tão sozinhos
que lindos olhos que lindos caracóis nos seus cabelos


                                                                Igor Zanoni

sábado, 26 de setembro de 2015

Knockin´at heavens door



só posso viver nos intervalos
e frestas
espaços que me permitem
e me permite a ilusão férrea que me leva
entre esquecimentos e rememorações
turvo como a chuva
corrijo a paisagem
me perco deixo que me percam
com uma pá retiro as palavras
acumuladas na porta do mundo
talvez um dia quem sabe?
em tempos menos sombrios
encontre nele lugar


                                                                Igor Zanoni