terça-feira, 28 de junho de 2011

Doutor Josino etc.

Doutor Josino etc.

Em uma das muitas vezes nas quais me tranquei no quarto por muitas semanas, sempre aproveitando para por em dia uma dissertação de mestrado ou ler a biografia toda de Trotsky por Isaac Deutcher, para ter do que falar depois, doutor Josino, o grande, um dos fundadores do movimento psiquiátrico e analítico moderno em Curitiba, idealizador junto com uma selecionada turma de médicos do antigo Hospital Pinel, pelo qual passamos quase todos os meus amigos, os melhores e mais talentosos, como regra sem exceção, disse-me que eu gostaria de ser como Emily Dickinson, que se fechou em casa para escrever poemas e cuidar dos filhos. Como não vi nesta aguda observação nenhuma crítica, comemorei-a experimentando um novo ansiolítico e escolhendo pela lista telefônica uma nova seita religiosa. Doutor Josino se divertia comigo e eu com ele, tratou-me por muito tempo sem cobrar, até que a concorrência e as terapias neo-lacanianas reduzissem seu borderô. É verdade que nessa mudança esteve implícita uma decepção com a Nova República e o governo Lula, já que ele tinha admiração por Carlos Lacerda, o temido e arguto tribuno.   Como sempre fui jacobino e não tinha dinheiro, ficamos sem nos ver mais, mas sempre tenho notícias por amigos, aos quais repete o bordão: “o que falta no Brasil é um bom partido de direita”. Eu concordo que falta qualquer partido, concordo que nos faltam tribunos, que o governo não pode muito, mas, além disso, na ditadura era jovem para prestar atenção em política, e de qualquer modo, prefiro me definir como um homem acima dos partidos. O único político que me emocionou foi Teotônio Vilela e o primeiro de que ouvi falar foi Tenório Cavalcanti. Acabei me decepcionando com essas conversas e tratei de cuidar sozinho de mim mesmo. Quando se está só pode-se ser um poço de contradições sem problemas. Parece que foi o próprio Freud que não viu nisso grande problema e se foi mesmo estou bem respaldado. De todo modo ainda tenho certa gratidão pelo doutor Josino, embora tenha visto nele certo complexo de pai. É difícil falar dos pais, mas aceitei o fato pela companhia inteligente, por poder dar vasão à minha melancolia com um homem preparado e ter argumentos para faltar ao trabalho. Foi divertido, mas foi também foda.

                                                      Igor Zanoni

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