Caio Prado falava dos vários ritmos nos quais a produção material e as formas de sociabilidade ocorriam no Brasil, ritmos que, manifestando-se simultaneamente, pertenciam a origens diversas, e que não devia espantar o entrelaçamento do arcaico e do novo, pois essa é a característica da lenta gestação de uma nação dependente e periférica nos quadros da modernidade avassaladora do centro. Braudel falava também dos vários ritmos da história, e quando visitava uma grande cidade não necessariamente ia a seus museus e monumentos, mas aos açougues, ver como cortavam a carne. Há pouco se falava do fim da história, e o triunfo da eficiência dos mercados. Há já alguns anos se proclamava essa utopia do indivíduo afinal conquistada, a vitória final de certos aspectos do mundo moderno, nas entranhas do utilitarismo e da liberdade nele entranhada, liberdade do prisioneiro no Panopticon de
Bentham, no qual os presos assimilavam a sua vigilância como um dado de sua moral.
Essa visão positivista do novo abstrai a revisão súbita do sonho, a ressurreição dos seres em barricadas e a necessidade de contê-los para que dívidas sejam pagas, a propriedade mostre bem quais são os seus direitos. Eis de repente em que consistem os interiores do presente, eis a civilização, a democracia, finalmente mostradas, como há algum tempo não se via no centro, sem seus adereços de desejo disponível a baixo custo. No País, Caio Prado volta a se atualizar, reféns que somos da mídia e do sistema financeiro, ao mesmo tempo em que a corrupção subitamente é descoberta e tem um nome, o da esquerda com seus supostos mitos de justiça social, e que precisa ser imobilizada, amordaçada, para que o tempo seja sempre o do anacronismo e do adiamento indefinido de toda solidariedade enraizada na cultura comum.
Igor Zanoni
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