sábado, 19 de novembro de 2011

Culto à Ciência



O Colégio Culto à Ciência era em Campinas nos idos de sessenta e início dos setenta um dos melhores colégios do interior  de são Paulo, exemplo da boa escola pública de então, que havia tido entre seus professores nada menos que Santos Dumont. Havia um vestibular para ingressar no seu ginásio, com um preparatório de um ano após o primário. Posso dizer que estudei pouco lá, apenas o que amava, como Literatura, Francês e História, mas não me perdi demais nas outras matérias. Nunca reprovei sequer em Química, um dos meus pesadelos. Mas o melhor lá era o esporte, com o ginásio Alberto Krum e o grande campo de futebol onde havia traves, rede, jogos de camisa e campeonatos intercalasses. Ganhei muitas medalhas que a vida levou em basquete, handebol, corrida embora nenhuma de futebol. Era a época do futebol arte e dos esmerados jogos de botão, no qual eu era bem razoável. Época da ditadura também, que eu não podia compreender porque tudo em casa chegava filtrado por meu pai militar e por minha formação clássica e apolítica. Lia poetas simbolistas e nenhum modernista. O mais próximo eram as odes de Ricardo Reis. Tudo parecia exemplar e olímpico no colégio, até no hino que tínhamos de cantar nas cerimônias, algo como: “tu meu Culto à Ciencia és orgulho dessa moça falange estudiosa a teus pés minhas flores debulho tradição de Campinas gloriosa tu meu Culto á Ciencia és orgulho ontem hoje no tempo que passa só tens sido um brasão de renome na cultura geral de uma raça!”. Não é espantoso?   Mas dois fatos abriram meu olho para o que havia atrás do pano de cena. Uma foi o assassinato de um zelador, muito querido por todos, pelo marido de uma mulher que o visitava no colégio à noite. Foi difícil entender o que havia acontecido com tanta desinformação no ar, mas li o Correio Popular e entendi o drama. Outro foi o assassinato da professora de filosofia Margot Proença por seu marido, alto funcionário da justiça, com muitas facadas pelas costas, por haver descoberto uma traição. Esses acontecimentos foram o fim de nossa inocência ridícula. Percebi que era hora de ler Nelson Rodrigues e atualizar minha visão de mundo.


                                                    Igor Zanoni
                                                          

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