terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Mulher de soldado

Mulher de soldado

Nossa casa em Cáceres, no início dos anos sessenta, ficava em uma rua estreita, pela qual se passava a pé ou bicicleta, pois a cidade só tinha um carro que nunca vi circulando. As casas ali tinham uma pequena calçada, onde á noite se punham cadeiras para conversar e espantar o calor. Havia um jardim interior, perto do poço, face á cozinha e à copa abertas para ele, também para diminuir o calor úmido do Pantanal. Próximo acabava a rua, em uma estrada sem beiradas na qual cresciam gigantescos tamarineiros, mangueiras de todos os tipos e palmeiras de bocaiuva. Ali ficava o Hospital São Luís, onde meu pai, que servia no velho II Batalhão de Fronteira, atendia mordidos de cobra. Em frente à nossa casa morava um soldado, que servia com papai, com sua mulher amiga de mamãe e que tinha em seus dias vazios a companhia de um quati preso por uma comprida corrente em uma árvore no tal jardim interior das casas dali como já falei. Essa moça um dia me surpreendeu com a notícia de que sua casa era tão boa que tinha bidet. Eu ignorava o que era isso, e mamãe não quis me explicar. Ficou o dito pelo não dito, mas nem tanto. O final da história foi a descoberta pela moça de que o soldado a traía com as que frequentavam o quartel ou por ali perto esperavam os soldados. Sua vingança foi horrível. Ateou fogo no vestido e no corpo, embebidos em querosene. Nunca mais soube dela, nem do soldado, e como sempre ninguém me explicou nada. As crianças precisam ser muito espertas, pois caso contrário não entenderiam da missa a metade. Minha sagacidade percebeu que mulher de soldado nem sempre é feliz, mesmo tendo uma bela casa com bidet e quati.


                                                                         Igor Zanoni

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