Nostalgia
A saudade, apesar ou por causa dos nossos contextos, mais
particulares ou mais gerais, remete ao passado, imaginando o quanto foi bom, mais
talvez do que realmente foi na época. O termo saudosismo foi cunhado para
demarcar, positiva ou negativamente, sentimentos e situações que gostaríamos de
reviver, um sociólogo ou um psicanalista diria por quê. No Brasil, ao tempo do
samba-canção, tudo era saudade, e as músicas falavam de amores perdidos
marcando para sempre a possibilidade de voltar a amar, a loucura em que o amor
pode se transformar, a casinha sem teto na qual se vivia tão bem olhando as
estrelas e assim por diante. Nos governos JK e Jango as coisas começaram a
mudar e brotaram sensibilidades menos provincianas, do tempo em que a tragédia
era a glória de uma vida. João Gilberto cantou: “Chega de saudade!”. Há o velho
sob a capa do novo, atualizando-se retrogradamente em ralações de opressão e
despossessão. Isto quem mostra é Glauber Rocha. Aí o samba-canção ficou uma
coisa irremediavelmente velha, anacrônica, saudade para saudosistas ou
sadomasoquistas. Nostalgia, por sua vez, é a capacidade de pensar, nos momentos
cruciais da história, a possibilidade de mudança, de superar o atraso, a
desrazão, a prepotência, o mandonismo, a graça concedida do alto, por quem
manda. È também a possibilidade de ver que atores sociais poderiam levar
adiante essas mudanças. Esclarecendo uma distinção semântica, e por isso muito
importante, sou nostálgico de muita pouca, saudoso de nenhuma .
Igor Zanoni
Nenhum comentário:
Postar um comentário