para passear no bairro alto, seria ótimo poder contar
com uma tartaruga, exemplo ancestral de paciência, ponderado vagar, silêncio e
amor a uma vida longa e protegida. exemplo também do amigo calado idealizado
por Drummond em um poema entre os muitos de que me lembro mal mas vividamente. mas claro que não se pode achar nunca nenhuma.
a prefeitura não conserta as calçadas do bairro, as que existem, e o trânsito é
metropolitano, e ela não teria como habitar aqui entre nós. o jair césar, antigo
chefe político no bairro, talvez a denunciasse em seu jornalzinho, e não se
sabe o que pensariam os padres, mesmo nos novos tempos do buen vivir. mas o
principal é que se sumisse uma delas os haitianos que vieram, num gesto tão
caloroso como proclamar a república que horrorizou o império e varnhagen, morar
em bairro tão inóspito, seriam acusados de furto ou algo pior. o manuel, que
tem uma padaria na minha esquina, disse que precisava de um ajudante e pensou
em contratar um haitiano mas desistiu porque, segundo dizem os curitibanos,
eles são mortos de fome. em vez disso, contratou uma mocinha evangélica
indicada pelo pastor da igreja mundial do poder de deus que fica entre meu
condomínio e a padaria. uma mulata jovem e bonita, magrinha, quem sabe temerosa
de uma autoridade como o pastor e menos dada a aventuras revolucionárias como
comer.
Igor Zanoni
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