terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Dona Rosalinda



dona Rosalinda não era especialmente estimada por ninguém, exceto seu noivo, mas como professora primária tinha seu lugar na comunidade. tinha qualidades de muitos jovens, como ser pequena e tímida, um tanto ou quanto bonitinha e, enfim, ser mulher. isto não vale muito sempre, mas ela aproveitou o espaço de que dispunha para ser professora primária, ser valorizada por isto e atrair um partido razoável. os noivados então duravam muito, porque os namoros eram curtos, para não manchar o nome da moça, e havia que providenciar casa, mobiliário, enxoval e muitos detalhes imprescindíveis antes de poder se realizar o casamento. mas o noivo era trabalhador e antes que eu me desse conta minha professora no Colégio Santa Maria, em Cáceres, estava na igreja, de onde ela, o agora marido e convidados se retiraram para uma recepção frugal mas decente no único restaurante da cidade. houve um baile que se estendeu até pouco depois da meia-noite, do qual dona Rosalinda foi mais cedo para casa por sentir-se indisposta. ocorre que a indisposição agravou-se em óbito, antes de consumado o casamento, mas que o agora legalmente marido achou por bem consumar na eternidade, tomando formicida. no dia seguinte minha professora foi levada pela cidade ao cemitério, para o qual todavia não pôde seguir o agora marido, mais que isso, viúvo, também falecido, pois o cemitério não era lugar para sacrílegos que se matavam por amor, mesmo que pelo amor de dona Rosalinda . Esta certamente jamais sonhara o infeliz destino de provocar uma morte por amor, e certamente preferia que seu amado tivesse lugar ao seu lado também no campo santo onde agora seu corpo, mas não sua alma, jazia. Os frades, jesuítas holandeses, poderiam levar isto em conta, mas havia todo um direito canônico a obedecer, todo um conhecimento que minha professora nunca chegaria a entender, mesmo que vivesse para sempre.


                                                                      Igor Zanoni



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