dona Rosalinda não era especialmente estimada por
ninguém, exceto seu noivo, mas como professora primária tinha seu lugar na
comunidade. tinha qualidades de muitos jovens, como ser pequena e tímida, um
tanto ou quanto bonitinha e, enfim, ser mulher. isto não vale muito sempre, mas
ela aproveitou o espaço de que dispunha para ser professora primária, ser
valorizada por isto e atrair um partido razoável. os noivados então duravam
muito, porque os namoros eram curtos, para não manchar o nome da moça, e havia
que providenciar casa, mobiliário, enxoval e muitos detalhes imprescindíveis
antes de poder se realizar o casamento. mas o noivo era trabalhador e antes que
eu me desse conta minha professora no Colégio Santa Maria, em Cáceres, estava
na igreja, de onde ela, o agora marido e convidados se retiraram para uma
recepção frugal mas decente no único restaurante da cidade. houve um baile que
se estendeu até pouco depois da meia-noite, do qual dona Rosalinda foi mais
cedo para casa por sentir-se indisposta. ocorre que a indisposição agravou-se
em óbito, antes de consumado o casamento, mas que o agora legalmente marido
achou por bem consumar na eternidade, tomando formicida. no dia seguinte minha
professora foi levada pela cidade ao cemitério, para o qual todavia não pôde
seguir o agora marido, mais que isso, viúvo, também falecido, pois o cemitério
não era lugar para sacrílegos que se matavam por amor, mesmo que pelo amor de
dona Rosalinda . Esta certamente jamais sonhara o infeliz destino de provocar
uma morte por amor, e certamente preferia que seu amado tivesse lugar ao seu
lado também no campo santo onde agora seu corpo, mas não sua alma, jazia. Os
frades, jesuítas holandeses, poderiam levar isto em conta, mas havia todo um
direito canônico a obedecer, todo um conhecimento que minha professora nunca
chegaria a entender, mesmo que vivesse para sempre.
Igor Zanoni
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