terça-feira, 23 de junho de 2015

Correspondência



talvez isto seja incompreensível para muitos hoje, mas logo que aprendi a ler e escrever passei a manter uma correspondência com minha avó que durou muitos anos. eu morava em Campinas mas tínhamos vindo do Rio com meu pai que era oficial do Exército, minha avó passava as férias conosco ou eu ia para lá com tio Newton, que possuía um escritório em São Paulo. no intervalo, eu tinha um motivo para diminuir minha ociosidade e meu tédio escrevendo cartas que nada diziam de essencial, enviavam mensagens banais sobre nós e perguntava sobre a saúde de todos por lá. o importante era comprar papel de carta, havia de vários tipos e preços, envelopes comuns brancos ou com bordas listradas verde e amarelas, e um aviso “Via aérea-Par avion”, para que ficasse claro que o Correio entregava suas encomendas através de transportes rápidos e eficientes. eu  começa com um clássico : “Querida vovó, abençam”, pois sequer sabia escrever um pedido convencional de benção, que todas as crianças pediam a seus pais e avós. mas ela respondia com um “Deus te abençoe”, falava um pouco de si, da crônica enxaqueca de meu avô e copiava versículos bíblicos, em geral retirados das cartas de Paulo a Timóteo, com muitos conselhos sobre como um jovem deve viver. sei de cor esses conselhos, e Paulo se tornou meu herói, maior que Jesus, dando-me um indelével vezo protestante.


                                                                            Igor Zanoni

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