ele me atraia por ser o primeiro negro com o qual tive
maior convívio, quando não se usava sequer a palavra negro. cuidava da
manutenção do colégio, dirigia os funcionários da limpeza e da cantina, fechava
os portões enormes depois do turno da noite e dormia em algum cômodo que nunca
conheci. falava muito pouco conosco mas mantinha um ar solícito, bonachão, indo
sempre para algum lugar. o colégio não tinha vigilância, ainda se confiava em
guarda-noturnos embora em algum lugar da cidade existissem inspetores de
polícia, temidos não sabíamos por quem mas com façanhas que conhecíamos por
alto. naquele dia não houve aula, é claro, e o Correio do Povo que papai
assinava trouxe seu rosto na primeira página, estranho, como uma infeliz
fotografia três por quatro. ele havia sido morto com muitos tiros pelo marido
de sua amante que, soubemos, visitava-o no colégio de madrugada. foram muitas
novidades em um só acontecimento e por muitos dias senti em Campinas uma cidade
sinistra que agora aparecia.
Igor
Zanoni
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