quarta-feira, 10 de setembro de 2014

Russos


quando passávamos a uma circulação mais ampla que a das relações familiares mudávamos os interesses de forma brutal para mim, que sempre me mantive o mais conservador e ignorante de todos os meus amigos. Marta me perguntou, penso que na única vez em que conversamos, enquanto descíamos a Rua Jorge Henning´s rumo ao ponto do bonde, se eu gostava de teatro. pergunta causadora de grande embaraço e perplexidade, tanto que passei a ver na minha amiga uma de tantas jovens que traíam a doçura da adolescência por um tesouro cujo valor me escapava. Sandra escrevia poemas, como eu mesmo já escrevia ou tentava escrever, mas seus poemas eram confusos e remetiam a sentimentos difíceis. os amigos em geral eram muito mais tolos, mas o problema eram as moças. felizmente havia Natália, que morava em uma bela casa envidraçada na esquina, irmã de Orest , cujo pai era professor de física na nascente Unicamp. ela era extremamente linda, muito alta e loira, e parecia não pensar especialmente em nada, embora também jamais em mim. em uma briga memorável com o irmão, saíram correndo pela casa mas Orest escapou para a rua ao mesmo tempo em que Natália esmurrava a porta de vidro que ele havia fechado. cortou muito o braço e a mão e foi operada, mas não comentou nada depois. pela primeira vez percebi algo particular nos russos e gostei muito. neles havia movimento, vida e beleza, sem tanta conversa.


                                                    Igor Zanoni

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