domingo, 8 de fevereiro de 2015

A Guerra Fria



meu pai era do corpo de saúde do exército brasileiro e pude perceber, em parte por isso, em parte, mais tarde, por estudar em grandes centros universitários, usp e unicamp, o significado da ditadura no brasil e na américa latina, cuja herança ainda carregamos talvez de modo irrevogável. além disso, percebia em casa e no quartel que frequentava, ajudando papai e me divertindo andando a cavalo ou jogando futebol, que vivíamos um mundo marcado pela guerra fria e o medo de o comunismo tomar o ocidente e o país. soube dessas coisas como garoto e como estudante de filosofia e de economia, não como militante político, mister para o qual nunca me senti apto. na faculdade havia uma grande deficiência de bons autores modernos ou antigos nas áreas que estudava. na filosofia recorri a edições francesas. tinha noção da língua já do culto à ciência e o resto procurei aprender com dicionário. mas o castelhano foi precioso em especial na economia da unicamp, pois as editoras latino-americanas e da espanha forneciam livros aos quais de outro modo não teria acesso na época, incluindo a imensa literatura, a meu ver mais precoce e rica que a nossa, das ex-colônias espanholas, analistas sociais e historiadores incomparáveis da região, traduções de clássicos de economia política e economia keynesiana, autores estruturalistas e formuladores do planejamento econômico. foi também crucial para mim, que era um estudante pobre, trabalhando para estudar como estagiário de pesquisa e já mantendo uma pequena família, o fato de que essas edições eram e ainda são muito mais baratas que as nacionais. para fechar o quadro, havia uma abundante disponibilidade de livros da academia de ciências da urss, que me interessaram sobretudo por seus manuais de matemática bem como de física e escritores com gorki, entre muitos outros. assim, no brasil a opinião pública é quase sempre desfavorável a tudo que lembre a américa latina e a urss, além de as ciências sociais possuírem uma visão americana ante que outra, mais originária e européia, e desprezarem muito do pensamento tão original da américa latina. mas eu não seria o professor que sou sem ter lido tantos autores que me ofereceram módica e abundantemente a puf, classiques garnier, cepal, siglo xxi, editorial kier, editorial losada, emecê, seix-barral e inúmeras outras livrarias, e, é claro, a academia de ciências de moscou.

                                                          Igor Zanoni

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