quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Comunicando-se


Comunicando-se

O celular foi uma das respostas bem sucedida para o problema da chamada multidão solitária. Muito oneroso no início, seu preço caiu bastante nos últimos tempos, ao mesmo tempo em que os modelos mais complexos e caros incluíam outros artefatos como internet e televisão, máquina de fotografia e filmadora e outros. Mas o mais importante continua a ser a chance de falar com os mais próximos a qualquer tempo. As ligações continuam caras, mas é possível aproveitar promoções como comprar um aparelho com tarifas reduzidas para chamadas de números da mesma operadora ou listar um certo número de aparelhos com chamadas gratuitas. Pelo menos com os mais próximos, o filho, a casa, o namorado ou a namorada, o trabalho, fica-se em contato o tempo todo. Pode-se chamar alguém em uma viagem de ônibus ou no meio da rua, sempre com o ar meio amalucado de quem parece estar falando sozinho e aos gritos. Pode-se montar as estratégias do dia dessa forma, organizar a vida da família, ter certeza de que o filho chegou da escola, dizer onde se está e a que horas se chega. Há pessoas que dormem ao lado de seu celular, que ademais é despertador, recebe notícias da mídia e mensagens ou torpedos a qualquer hora. Criou-se uma comunicação diuturna, um estado de alerta permanente em que se tem a impressão de que a vida está sob certo controle. Essas estratégias ficam mais eficazes e baratas que usar telefone ou internet.
Não que esta não seja usada. Não só para os contatos convencionais de estudo, trabalho ou outros mas sobretudo na lan houses com as várias horas de lazer passadas na comunidade cada vez maior do Orkut, onde conhecidos chamam conhecidos e desconhecidos, trocam  perigosamente fotos e informações, o que atinge adolescentes muito jovens em diante, até homens e mulheres entediados com a vida, que chegam a tramar amores virtuais com alguém que nunca conhecerão nem sabe ao certo quem é. Porque estamos num mundo de fantasia aqui, a fantasia de que o mundo é tão pobre.
Ao mesmo tempo, o contato com vária pessoas ao mesmo tempo ritualiza a comunicação, abrevia as informações e as palavras, insere desenhos com carinhas tristes ou alegres mostrando o estado de espírito do momento. Estado que muda a cada momento com essa hiperatividade. O crucial é não ficar só um momento, estar num ritual de vida abundante, de toques e carícias ininterruptos, de informações que se auto geram e se propagam indefinidamente, como se assim estivéssemos em contato indestrutível com a vida, um pacto com o eterno e com o universal que aos poucos acessamos. O celular e o Orkut também nos expõem o tempo todo aos outros. Uma vez inscrito no Orkut nunca se sai de lá, suas informações e sua imagem ficam lá, os laços não podem ser totalmente rompidos. O celular é chamado “vigia” porque o custo de carregá-lo é expor onde se está, o que se está provavelmente fazendo, é decretado o fim da solidão mas compulsoriamente. O feitiço é tão intenso que conheci uma moça que havia adquirido com enorme felicidade seu primeiro celular dizendo que precisava se comunicar, e como faria isso sem um celular? É claro que o celular também localiza profissionais, pequenos prestadores de serviços diversos, e é bem útil para a sobrevivência diária dos mais pobres. Sua importância em outras áreas pode ser facilmente imaginada. De qualquer modo, não há mais mão sem celular,seja de ricos ou pobres, seja qual for a idade, vigiando como um pequeno espião ou servindo como um erótico agenciador do imponderável.

                                                                                                    igor

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