Precocidade
Um professor notou que as alunas da escola em que trabalhava usavam muitas pulseiras coloridas de várias cores e demorou a saber o motivo. As pulseiras significavam desejos que as meninas concediam aos meninos que conseguiam roubar uma delas, cuja cor significava o tipo de prêmio a que estes tinham direito. Eram desejos sexuais, que iam desde um beijo na boca a uma relação de sexo oral. Estas meninas eram muito novas, com onze ou pouco mais anos de idade, demonstrando a precocidade com que eram inseridas no saber sexual. Como já se disse, o sexo é a diversão mais barata e gostosa a que um adolescente pode aspirar. Mas esse comportamento bastante desinibido, é claro, não é ode todos os adolescentes ou pré-adolescentes. Grande parte deles, nas faixas sociais da classe média, pratica sexo e têm mesmo filhos precocemente, mas a maior parte (quem sabe?) ainda é protegida por um mundo de aspirações infantis que inclui a educação, a diversão controlada pelos pais, a amizade preferencialmente com adolescentes do mesmo sexo e o brinquedo com estes, o mundo familiar bastante tradicional em vários sentidos, como o da religiosidade. Como no tempo em que Freud descobriu o caráter passional dos seres humanos, o sexo ainda é um motivo de grandes frustrações, neuroses e dificuldades emocionais de toda ordem, e a melhor solução para isso não necessariamente é uma vida sexual ativa desde cedo ou sem mediações de valores éticos e de responsabilidade para com o parceiro. Como disse Cristopher Lasch, a falta dessa responsabilidade cria sofrimento e tristeza. Se o homem é um ser desejante, também há uma grande manipulação da enxurrada midiática que recebemos todos os dias ressignificando beber cerveja ou ter um carro. Ou comprar um brinquedo, ou ter um amigo, ou praticar bem um esporte, a lista é infinita. Esse deslocamento do desejo sexual ou sua reafirmação metafórica é capaz de criar tantos indivíduos neuróticos e incapazes de realizar desejos como uma educação sexual muito repressiva. Quem ganha pouco não pode aspirar ao tênis que se sabe melhor e mais bonito. Essa é a porta para a drogadição, a violência. Por isso o sexo deve ser pensado dentro de uma economia política que envolve distribuição de renda, padrões de consumo, relações de sociabilidade mercantil e outras. Apenas ter um parceiro, com freqüência muitos, e atingir o orgasmo com certa freqüência não tem nenhum efeito liberatório sobre uma vida emocional reprimida e difícil. No ser humano nada é apenas natural ou biológico, mas passa pelo crivo cultural e, portanto, por valores e significados éticos. O importante é que a educação ou o sujeito possa perceber os sentidos em que sua vida está involucrada ou encalacrada. Na minha juventude, a liberação sexual era buscada numa sociedade muito repressiva em vários aspectos além do sexual, e muitos de nós buscavam novas expressões religiosas, culturais e outras ao lado de uma vida sexual mais satisfatória. Havia uma vontade de mudar o mundo, não havia? Muitos se envolviam com política, ou com a problematização da educação, do uso do meio-ambiente, e outras áreas. Muitos passaram neste período a fazer terapia, a se tornar terapeutas ou ler obras sobre terapia. A Igreja respondeu com os livros de Michel Quoist, os cursilhos para jovens e vi muitos amigos jovens dentro de uma participação na vida social e cultural mais lúcida que a minha. Eu não tive educação sexual em casa, mas fui embalado na vida caseira como uma cigarra no casulo até o momento de cantar, mas não posso dizer o sofrimento que isso me causou. Nem a forma abrupta e autodidata com que a vida sexual começou, envolvendo sentimentos difíceis de manejar. Se isso for ainda verdade, o que acho que é, precisamos pensar o desejo como sexo, dinheiro, cultura, políticas públicas para as questões sociais e assim por diante.
Igor
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