Tudo que nos toca
Dizem os mestres budistas que tudo que nos toca e nos emociona retiramos de um depósito imemorial que perpassa toda a humanidade e suas eras. Chama-se alayavijnana, nosso carma coletivo. O carma não é um acontecimento inelutável e fatal, podemos lidar com ele, podemos mudar o que trazemos na alma, quando sentimos que isso é necessário, que carregamos peso demais na viagem. Mas ele existe, como um televisor com vários canais e programas; assistimos alguns, vivemos o que se passa à nossa frente, colocamos fundas suas percepções em nós, ou mudamos o canal. É possível aos grandes mestres até desligar o televisor. Quando sentimos algo, isto é também uma contribuição para o depósito de emoções. Podemos suavizá-lo ou carregá-lo de maus presságios. De qualquer modo a experiência de cada um está ligada á coletividade que nos envolve com seus projetos, humores, compreensão das coisas. Em geral fazemos e sentimos ou vivemos ignorantes do que está por detrás do filme que encarnamos. Para nós é natural tomar certos caminhos ou direções, para outros não. Essa ignorância segundo o lama Padma Samten é perceber certas coisas e não ver outras. Por exemplo: começa um jogo Brasil e Argentina e imediatamente começamos a torcer pelo Brasil. Ou quando brigamos com alguém começamos as nossas maledicências. A ignorância liga-se a gostar disso e não gostar daquilo, sem razão óbvia, não gostamos ou gostamos apenas. “E quando temos problemas sérios, que nos deprimem, vamos ao psicanalista e ele pergunta:” Mas afinal, qual é o seu desejo?”. Do que gostamos, o que queremos, e a roda da vida gira seu giro insensato e cruel. Porque a sua essência é o sofrimento. No fundo mesmo quando estamos muito felizes logo vamos sofrer, vivemos sempre realidades que nos tocam, tornam a vida difícil, mas seguimos girando a roda e escolhendo: isso sim, isso não, dependendo de como acessamos alayavijnana e de como contribuímos para ele.
Igor Zanoni
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